30.9.04

Teatro virtual

Se o número de espectadores que cada noite aparecer no Maria Matos for equivalente à media de visitantes diária deste blogue já era bem melhor do que aquilo que muitos espectáculos têm. O blogue, criado há pouco mais de uma semana já recebeu perto de 1 500 visitantes e conta com quase 200 visitas diárias. E continua a subir. Parece que há para aí muita gente disposta a dizer e ouvir Urgências. Esperamos que a visita virtual seja o isco certo para garantir a visita real, a partir de 15 de Outubro, no Teatro Maria Matos.

29.9.04

O mágico sem cartola

O Maria Matos estava fechado e foi reaberto especialmente para o projecto Urgências. O que encontrámos no primeiro dia de ensaios foi um teatro despido dos panos, da parafernália técnica, dos pormenores que lhe dão o aspecto de um lugar de ilusões. Um teatro como um mágico que perdeu a cartola e não tem como fazer surgir do nada os seus coelhos brancos.
É precisamente numa casa assim, um teatro nu, que queremos construir este espectáculo feito de urgências. E desejamos que o público deste espectáculo possa ver a carcaça do teatro, aquilo que quase sempre é escondido em nome da ilusão: as cordas, as portas, as varas, os projectores, os fios, os bastidores, a realidade.
As urgências são coisas que não podemos esperar mais tempo para dizer. Quando as dissermos podem ser velozes como um telegrama ou uma mensagem deixada num post it, podem ter engasgos e hesitações, mas serão vitais. A 15 de Outubro queremos que este teatro seja uma assembleia onde são ditas as coisas que realmente nos fizeram estar na rua nessa noite. Não há tempo nem vontade de tirar coelhos da cartola. O mágico terá que parar de nos entreter e dizer o que pensa. TR

28.9.04

As vossas urgências

Uma das particularidades do espectáculo URGÊNCIAS é que, nos intervalos entre cada uma das sete peças curtas que iremos apresentar, os actores irão ler em palco algumas «urgências» que os leitores deste blogue nos fizerem chegar.O desafio é simples: enviem-nos textos com aquilo que tem de urgente para nos dizer. Coisas sérias ou nem por isso. Mensagens ao país ou aos vossos parentes. A única condição é que sejam as vossas urgências. Depois basta enviá-las para urgencias@sapo.pt. Publicaremos alguns textos no blogue e, a partir de dia 15 de Outubro, as melhores «urgências» subirão ao palco do Maria Matos.

Segue-se uma urgência outonal enviada por Rui Azevedo.

Aqui estou, ansioso, sentado numa núvem, a olhar para ti.
Tu nem sequer me vês, nem sequer me sentes.
O prazer é, com certeza, todo meu.
Celebro mais um Outono como se o Outono tivesse algo de bom para celebrar.
Uma estação transitória, que apenas dura a queda de uma folha. No Outono não
se celebra a vida nem a morte, celebra-se a queda, celebra-se uma
tranjectória descendente. Quando a folha toca o chão já é Inverno.
Outono, Outubro, ou... ou outra coisa qualquer. Depois do se... de Setembro,
vem o ou... de Outubro. O Outono é uma sucessão de conjunções, de ideias
adiadas para só serem realizadas no... vembro.
Mas ainda assim é bonito. A decadência tem o seu lado belo. A folha que cai,
a árvore que se despe, o céu que se enubla de cinzento, a chuva que chove
mas não molha, o frio que adoenta mas não gela, os dias que encolhem mas não
muito.
Tudo tem a sua beleza.
Tudo tem a sua tristeza.
Tudo transita para o Inverno que se prevê ainda pior.


27.9.04

O kit

A minha estreia em teatro foi, estranhamente, como encenador. Estranhamente, porque não é habitual a primeira experiência profissional de alguém em teatro passar de imediato pela encenação. E também porque, passados seis anos, acredito cada vez menos na figura do encenador, tal como a conhecemos. Mas adiante. Não é isto o essencial.
Serve esta introdução apenas para recordar a prenda que os actores desse primeiro espectáculo que encenei me deram no meu dia de anos. Faltava cerca de um mês antes para a estreia. A prenda vinha dentro de uma caixa de sapatos. Eles chamaram-lhe «kit de encenação». Um bloco de notas, uma caneta, um relógio e um cinzeiro.
Agora, nas Urgências reencontro algumas pessoas que participaram nesse meu primeiro espectáculo - a Cláudia Jardim e a Joana Seixas. Amanhã, no ensaios no Maria Matos, vou dizer-lhes que continuo a usar a prenda que me deram. Apesar de não assumir o meu papel neste projecto propriamente como o de um encenador, participo na construção de todas as peças curtas das Urgências. Numa sou autor e noutra actor. Nas cinco restantes, estarei sentado na plateia, tentando ajudar o autor e actores de cada peça a contruir as suas Urgências.
Amanhã vou pôr uma mesa entre a quarta e quinta filas. Em cima dela o meu kit de encenador. Porventura será outro bloco de notas, outra caneta, outro relógio e outro cinzeiro. Mas o entusiasmo, o prazer, a angústia e a esperança, essas são as mesmas de quando me estreei.
TR

26.9.04

Aung San Suu Kyi

Tenho sempre muita dificuldade em escrever, mas acho que esta é uma boa oportunidade que não quero desperdiçar.

Acho que todos conhecemos AUNG SAN SUU KYI, a birmanesa que ganhou prémio nobel da paz. Uma mulher que deixou os seus dois filhos e marido em Inglaterra, para regressar ao seu país e lutar pela democracia. Nunca tinha pensado neste “abandono” dos filhos por parte da AUNG SAN SUU KYI até a minha filha nascer. É algo que me perturba imenso. Ter a coragem de deixar os dois filhos com o pai e esperar que eles nunca a acusem de abandono é arriscar muito alto. Abdicar de uma vida plena pela solidão certa, por um país, é de uma generosidade imensa. Agora sempre que penso na AUNG SAN SUU KYI desejo muito que ela consiga que a Birmânia seja uma democracia, para ela abraçar os seus filhos de novo.

Site oficial de AUNG SAN SUU KYI: www.dassk.org

MB

O primeiro

Esta é a primeira Urgência enviada por um leitor do blogue. Ele é o Miguel Tomar Nogueira e também tem espaços da sua autoria na blogosfera: www.3actos.blogspot.com e www.elasmaiseles.blogspot.com. É natural que o Miguel tenha sido o primeiro a aderir ao nosso desafio. É quase batota se não soubéssemos que é genuíno. É que o Miguel é um amigo. E não fosse a admiração que têm por ele os que o conhecem, quase lhe podíamos chamar um fã. Aqui vai a Urgência que o Miguel nos enviou para urgencias@sapo.pt.


A minha urgência é partilhar em textos, sons, e imagens, as fortes emoções que me invadem. A dor no peito de sentir demasiado, ser feliz em demasia, amar em quantidades interplanetárias. Urgente é saber como o fazer. Os abraços, o toque, as vozes já não chegam. Já nem os olhos são suficientes, mesmo que usem todos os seus truques. Esta é a minha urgência. Urgente. Antes que me leve às urgências.

Miguel Tomar Nogueira

25.9.04

A angústia

Quando as primeiras reuniões aconteceram, os prazos dados eram apertados. Afinal, se o que temos para dizer é urgente, por definição, temos de encontrar tempo para escrevê-lo. Pois bem. Nunca na vida falhei deadlines de forma tão aviltante. Cheguei a mentir aos meus actores, inventando prazos de entrega que não cumpria (uma forma bizarra de me obrigar a escrever).
O problema? À segunda, terceira deixa, uma das personagens dizia uma piada. Parece estúpido? É capaz de ser. Mas talvez ainda não vos tenhamos dito que esta é a primeira produção teatral das Produções Fictícias fora do campo do humor. Talvez seja necessário explicar que a escrita industrial de comédia tem destas coisas, pode ter efeitos perniciosos sobre a nossa mente. Depois, súbito, uma noite - como seria de esperar num bom e velho lugar-comum - a minha urgência escreveu-se por si.
Ontem, às voltas com as 16 páginas que decorava, o Luís Mestre ligou-me noite dentro para dar conta de algumas angústias. De frases que lhe magoavam. Fiquei contente. As frases magoam porque ele, tal como eu, já as ouviu e já as disse. Talvez, queiram os deuses, haja um carácter universal nesta urgência. Talvez não. LFB

A stanada

Bastante mais do que em Portugal, o Tiago faz teatro no estrangeiro, percorrendo a Europa no seio dos belgas STAN (Stop Thinking About Names). Este grupo tem como conceito, em duas linhas, subir ao palco pela primeira vez no dia da estreia. Conhecer profundamente o texto, estudar as personagens, fazer mil leituras, não marcar as cenas e não pisar o palco até ao dia em que o público também lá está.
Inspirados por esta filosofia, pela renovação contínua, noite após noite, de um texto de teatro e respectiva interpretação; inspirados ainda pelo soberbo "Questionism" (com Frank Vercruyssen) que os STAN apresentaram há poucos meses em Lx; e convencidos (bem) de que este tipo de trabalho se adequava na perfeição ao nosso conceito de "Urgências", o Nuno Artur e o Tiago decidiram adoptar um método de trabalho semelhante para o nosso tempo no Maria Matos. Aquilo que se resolveu apelidar de "Stanada". Fica o registo. LFB

Pink Floyd

Recordei ontem, por acaso, o tema que considero ser a melhor canção de amor de sempre. Opiniões, exageros e subjectividades à parte, na minha "urgência", esta poderia muito bem ser a canção que a Maria dedicava ao Luís.

So, so you think you can tell
Heaven from Hell
Blue skies from Pain?
Can you tell a green field
From a cold steel rail ?
A smile from a veil?
Do you think you can tell
And did they get you to trade
Your heroes for ghosts?
Hot ashes for trees?
Hot air for a cool breeze?
Cold comfort for chains?
And did you exchange
A walk on part in the war
For a lead role in a cage?
How I wish, how I wish you were here
We're just two lost souls
swimming in a fish bowl
Year after year
Running over the same old ground
What have we found?
The same old fears
Wish you were here

LFB

24.9.04

Aproximação

Para começo, deixo um poema de Sebastião Alba. Funciona, julgo, como uma primeira aproximação à minha urgência. Traz, pelo menos, uma das palavras que tenho mais urgência em pronunciar (e que o Luís trouxe para a mesa): casas. Casa.

“As casas constroem-se de sombra
quatro sombras ao alto
longe da esfinge dos astros

Falamos das cidades
dos homens que de tão sós
as despovoam
Das casas nunca
Só as casas solitárias têm história

Giram na noite presas
à face da terra

E vede
a plasticidade das casas
ao sol
a amabilidade das casas
à porta
a incomunicabilidade das casas
sob os bombardeios”. NCS

Eu e tu não somos Nós

É o título da minha urgência. Os meus actores são o Luís Mestre e a Cristina Carvalhal. O Luís é meu amigo há 7 anos e há esse tempo todo que andamos para trabalhar juntos. A Cristina (juntamente com a Alexandra Lencastre) é uma das minhas musas da adolescência - que ainda pouco passou do adro. Nos próximos dias falarei mais deles.
Interpretam o "Luís" e a "Maria", nomes propositadamente comuns. Neste momento, estão a decorar texto. Amanhã, pela primeira vez em nossa casa, eles vão movimentar-se no palco sem folhas de papel. E eu vou ter inveja. LFB

A urgência

O que é que eu tenho de urgente para vos dizer? Uma confissão. Um desabafo. O exorcismo de um fantasma poderoso. Quero dizer-vos que, às vezes, o amor acaba. Pura e simplesmente. Sem motivo. Sem terceira pessoa envolvida ou hábitos perniciosos de cortar as unhas dos pés na cama, por exemplo. Não. Acaba, chega ao fim, morre, fica sem bateria, pifa, vai abaixo, desfalece, cai, tropeça e não se levanta mais.
E, muitas vezes, a pergunta que o abandonado mais faz - perante o anúncio da ruptura - "Porquê? Porquê?", não tem mesmo resposta, não faz mesmo sentido, e seria até mais lógica na cabeça do outro. Do que se vai embora. LFB

A casa

O teatro como casa. O Maria Matos. A equipa das Urgências está a partilhar, numa média de 10 horas por semana para cada segmento, o espaço desse teatro. Quatro paredes, um tecto, mesas e cadeiras - é uma casa. E agora é nossa. Como disse a Cláudia Jardim (actriz fantástica e uma das pessoas mais entusiastas e alegres deste projecto): "É como se vivéssemos todos no mesmo condomínio, mas não nos falamos".
Ainda não. Os horários e as vidas complicadas levam-nos a entrar quando outros saem ou vice-versa. Mas vai melhorar. Há dois dias, no melhor espírito utópico das reuniões iniciais, a Cláudia foi assistir a um dia de trabalho comigo, com o Tiago, a Cristina e o Luís. O vizinho veio beber chá. Daqui a dias, havemos de dar uma festa cá em casa. Para o prédio todo. LFB

23.9.04

As vossas urgências

Uma das particularidades do espectáculo URGÊNCIAS é que, nos intervalos entre cada uma das sete peças curtas que iremos apresentar, os actores irão ler em palco algumas «urgências» que os leitores deste blogue nos fizerem chegar.

O desafio é simples: enviem-nos textos com aquilo que tem de urgente para nos dizer. Coisas sérias ou nem por isso. Mensagens ao país ou aos vossos parentes. A única condição é que sejam as vossas urgências. Depois basta enviá-las para urgencias@sapo.pt

Publicaremos alguns textos no blogue e, a partir de dia 15 de Outubro, as melhores «urgências» subirão ao palco do Maria Matos.

E agora? O que é que tens de urgente para me dizer?

20.9.04

Um mês

O espectáculo "Urgências" é composto por sete peças curtas. Estas peças estão a ser construídas em conjunto por autores e actores que agora povoam o Maria Matos. Todos os eles tentando responder à pergunta: "o que é que tens de urgente para me dizer?". Como se alguém se tivesse levantado no meio duma plateia e colocado essa pergunta.
As sete respostas que, a partir de 15 de Outubro, serão mostradas ao público serão esboços. Serão, como todas as coisas que se dizem com urgência, peças vivas e incompletas. Serão, assumidamente, esboços. Se fossem pintura, seria gravuras em vez de óleos, esquiços em vez de pastéis.
Cada peça terá cerca de 15 minutos. Umas mais e outras menos. A média é essa. Não são os 15 minutos de fama, são os 15 minutos de urgência. O tempo disponível para se dizer o que não podia ficar para mais tarde.
Os ensaios começaram na segunda feira passada e têm acontecido a um ritmo bastante acelerado. Não é para menos. Temos um mês para, a partir de uma primeira versão do texto de cada autor, discutir, alterar, imaginar, decorar, ensaiar, montar e levar para palco cada uma das sete urgências. Um mês para ter a certeza de que tentamos dizer o essencial, sabendo que, como sempre, ficará tanto por dizer. Porque é urgente.

17.9.04

post it

URGÊNCIAS é um espectáculo feito de pequenas peças autónomas – um festival de curtas metragens em teatro. É um projecto que assenta na ideia de fazer do teatro um espaço onde se dizem coisas urgentes. Coisas que devem ser ditas aqui e agora. Acreditamos que o teatro oferece a oportunidade de agir imediatamente sobre a realidade e os acontecimentos. Algo que aconteceu hoje pode, daqui a um mês, ser objecto de um espectáculo. Queremos assumir que o teatro pode viver ao ritmo dos dias e alimentar-se também da actualidade, que o teatro é um espaço de debate e revelação do que urge dizer, fazer, ouvir e ver.