5.11.04

O acampamento

O blogue ficou deserto nesta última semana. O blogue como o palco e a plateia do Maria Matos, esvaziado de gente desde sábado passado. Depois da última noite de Urgências, aquele fantástico teatro municipal encerrou de novo as portas. Serão feitas obras e esperamos que reabra em breve, devolvido à cidade e aos cidadãos, com uma cara nova.
Percebemos, pela urgência com que mais de duas mil pessoas acorreram ao Maria Matos em apenas 12 noites, que inventámos uma coisa boa. Interessante, pelo menos. Sentimos que todos temos vontade de repetir a experiência e acreditamos cada vez mais que é possível tornar as Urgências um projecto que aconteça regularmente. Repetindo autores e actores e convidando pessoas novas, percebemos que talvez seja importante perguntarmo-nos que urgências temos para o ano e para outro e para outro. E desta fazê-lo com apoios, com tempo, a experimentar mais e a ir cada vez mais longe.
Os textos que compuseram este este espectáculo estarão, nas próximas semanas, disponíveis neste blogue. Assim que haja notícias sobre o futuro deste projecto, estarão também aqui neste blogue. Mas hoje, mais do que falar do futuro, é importante fazer o balanço destes meses intensos que foram a criação das primeiras Urgências. É curioso como, chegado a este ponto, percebo que já falei e escrevi tanto sobre o projecto que sou a pessoa menos indicada para fazer este balanço. Tudo o que disser vai soar a entrevista de promoção ou conversa de final de ensaio. Vou limitar-me a escrever o que seja absolutamente essencial.
Fazer as Urgências foi, acima de tudo, assistir a um exercício de generosidade. A generosidade dos autores que aceitaram colocar-se em causa e responder a uma pergunta, no mínimo, ambiciosa: o que é que tens de urgente para me dizer? A generosidade dos actores que se entregaram incondicionalmente a este projecto. A generosidade da produção, dos técnicos, de todos os que dedicaram o seu tempo a um projecto sem dinheiro, sem condições de trabalho, sem rede.
É quase ridículo agradecer a essas pessoas depois de ter visto a satisfação com quem enfrentaram a contrução deste espectáculo. A coisa certa a fazer, que não se pode fazer com um texto num blogue, é partilhar do sorriso que todos tinham estampado no rosto quando, pela última vez, saímos do Teatro maria Matos, no sábado passado. Escondido atrás do monitor do meu computador, do teclado, dos fios e ondas magnéticas que me afastam de quem leia este texto, eu partilho esse sorriso.
Sei que o momento é lamechas. Faz-me lembrar a única vez que fiz campismo. Fui para Vila Nova de Milfontes. Acampamento de Verão. Tinha 14 anos. Quando acabou começámos todos a chorar. É ridículo, é adolescente, é lamechas. Mas a verdade é que desde os 14 anos que não me sentia assim.

Adeus, campistas.

Tiago Rodrigues