7.10.04

As vossas urgências

Enquanto nada mais me ocorre, e porque nada há de mais urgente e impossível
do que dizer o amor ou, o que é o mesmo, o indizível (poucos poemas
sobreviveriam a tamanha catástrofe!), envio-vos um dos meus primeiros
encontros com a palavra «urgente». Foi escrito por um poeta que hoje diria
provavelmente ao próprio corpo «é urgente morreres».

URGENTEMENTE

É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.

É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.

É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.

Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.

Eugénio de Andrade

É urgente ler este poema para vos poder dizer que é urgente as palavras
reecontrarem o seu significado primordial, aquele que nunca ninguém ouviu e
que justificaria uns momentos de silêncio numa peça de teatro.

Uma Urgêcia enviada por Inês Fonseca Santos para urgencias@sapo.pt