5.10.04

Fantasmas

Começo por escrever que isto de ‘blog’ é uma absoluta novidade para mim. Aliás, o ‘blog’ das Urgências foi o primeiro que visitei. Motivo: sempre considerei que grande parte da informação colocada nestas paragens ‘virtuais’ é de uma pobreza que faz dó, ou lixo, se quiserem. (Constatei isso depois de visitar alguns…)


Quanto às Urgências, cá vai…


Nos nossos dias não existe espaço para a reflexão - somos a sociedade da informação - vive-se tudo de uma forma muito rápida, não temos tempo a perder. Tempo a perder?

Temos sim, tempo a recuperar: para nós, para a reflexão, a compreensão, o calor humano, as conversas de café, o livro esquecido na prateleira, o carinho...


Urgências fala, parece-me, sobre estas personagens que procuram o calor, o carinho e a compreensão num urbanismo envolto de pessoas que tentam a todo o custo sobreviver, onde não há espaço para a reflexão, para o pensamento.

É obrigatório agir, só existe espaço para agir. Para irmos com a corrente, com a cidade.

As vozes que vamos conhecendo, por aqui, partilham um enorme sofrimento, um certo autismo para com todos os elementos exteriores, onde a integração no tecido da cidade é difícil, a sua manutenção insuportável. Isto tudo, obviamente, afecta infernalmente as relações entre as pessoas.

É esta a Urgência… libertarmo-nos do tecido envolvente para conseguirmos respirar.


Felizmente nestas pequenas Urgências, quase diárias, existe o carinho de, juntos, irmos para a sala de ensaio, para o teatro, e trabalhar, ler, reler, “repetir”. No fim de 3, 4, 5 horas de ensaio o espaço, só, abre-se para o silêncio. Mas, se estivermos com atenção, as palavras ainda ecoam, aqui e ali. Consegue-se ouvir, sentir. Para mim, este momento é um dos momentos mágicos que o teatro tem, que não se explicam.

Aliás, sempre acreditei que existem fantasmas nos Teatros, pelo menos naqueles que aguentam e se ressentem com o peso da história. Esta semana, conheci os do Maria Matos: são três. E são divertidíssimos. Estão no Balcão, na primeira fila. Encontrei-os quando me esqueci de alguns objectos, com o calor de uma conversa a caminho do jantar. Para falar verdade, eram amuletos. Voltei, já sozinho. E quando me encaminho para a saída lateral do palco, lá estavam eles, divertidos. Talvez por terem companhia, não sei… Senti-me satisfeito. Já encontrei agentes do outro mundo com um semblante carregado. Em alguns teatros abandonados, em que tive a oportunidade de ensaiar, trabalhar. A relação parece-me óbvia.

(…)

Não vou concluir este texto, primeiro porque não tenho jeito para esse último parágrafo, e depois porque temo que pudesse sair qualquer coisa melodramática. E isso é uma coisa que eu seriamente evito.


Até breve.

O fantasma Luís Mestre