O texto mais urgente
1. As urgências esperam. As grandes urgências. O amor espera anos. A fome não espera anos. Mas a fome, em potência, fica saciada com comida. E o amor? Citemos o escritor sueco: a nossa necessidade de consolo é impossível de satisfazer.
2. Este desafio de escrever sobre o que consideramos urgente tem algumas armadilhas. Somos sempre demasiado pessoais quando escrevemos sobre os nossos medos. E as nossas urgências são os nossos medos. Se fossem menos dependentes do medo, as urgências não eram efectivamente urgentes. É sempre possível adiar um jogo. Ou uma curiosidade. Mas o medo, na medida em que o evitamos, tem uma indesmentível urgência. E para escaparmos ao medo fazemos tudo, mesmo dar ao medo a luz de um palco. Além disso, sabemos que não existe nada estritamente «pessoal». Não somos assim tão diferentes uns dos outros. A cada momento pessoas que lêem dizem a pessoas que escrevem que se sentem retratadas num determinado texto. E nem se conheciam. É assim em todas as artes. Quando Andrei Tarkovsky fez Zerkalo / O Espelho (1974), o seu filme mais fragmentário e obscuro, passou pela costumeira acusação de «formalismo» e «hermetismo». No entanto, muitos foram os espectadores que se lhe dirigiram agradecendo. Diziam que era assim mesmo, era mesmo como estava no filme. Nesse filme hermético e obscuro.
3. A minha Urgência não será talvez sobre a minha urgência. Uso um esboço de texto, frases que ficaram, uma situação. Mas quem escreve escreve sempre sob a sua urgência. Mesmo que, como no meu caso, afirme que o texto não é biográfico, que escreve friamente sobre um tema abstracto. Em todos os géneros, o texto foge, e nós corremos atrás; mas em teatro o texto é também dos actores, tem uma existência exterior não apenas textual, é magnificamente impuro, porque se mistura com as urgências de cada um. Se há uma coisa que o conceito destas Urgências me ensinou é que o teatro é o mais urgente dos textos.
Pedro Mexia
2. Este desafio de escrever sobre o que consideramos urgente tem algumas armadilhas. Somos sempre demasiado pessoais quando escrevemos sobre os nossos medos. E as nossas urgências são os nossos medos. Se fossem menos dependentes do medo, as urgências não eram efectivamente urgentes. É sempre possível adiar um jogo. Ou uma curiosidade. Mas o medo, na medida em que o evitamos, tem uma indesmentível urgência. E para escaparmos ao medo fazemos tudo, mesmo dar ao medo a luz de um palco. Além disso, sabemos que não existe nada estritamente «pessoal». Não somos assim tão diferentes uns dos outros. A cada momento pessoas que lêem dizem a pessoas que escrevem que se sentem retratadas num determinado texto. E nem se conheciam. É assim em todas as artes. Quando Andrei Tarkovsky fez Zerkalo / O Espelho (1974), o seu filme mais fragmentário e obscuro, passou pela costumeira acusação de «formalismo» e «hermetismo». No entanto, muitos foram os espectadores que se lhe dirigiram agradecendo. Diziam que era assim mesmo, era mesmo como estava no filme. Nesse filme hermético e obscuro.
3. A minha Urgência não será talvez sobre a minha urgência. Uso um esboço de texto, frases que ficaram, uma situação. Mas quem escreve escreve sempre sob a sua urgência. Mesmo que, como no meu caso, afirme que o texto não é biográfico, que escreve friamente sobre um tema abstracto. Em todos os géneros, o texto foge, e nós corremos atrás; mas em teatro o texto é também dos actores, tem uma existência exterior não apenas textual, é magnificamente impuro, porque se mistura com as urgências de cada um. Se há uma coisa que o conceito destas Urgências me ensinou é que o teatro é o mais urgente dos textos.
Pedro Mexia
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home